Notícias

O GECoRPA dirige exposição ao Director do IGESPAR a propósito de três concursos para obras em monumentos nacionais

O IGESPAR abriu, recentemente, três concursos públicos para intervenções de conservação em três monumentos nacionais, património mundial da UNESCO:

Mosteiro de Alcobaça, Mosteiro da Batalha e Convento de Cristo, em Tomar.

Apesar da legislação aplicável ao exercício de actividade de empreiteiro, concebida sobretudo para a construção corrente, prever uma qualificação própria para as obras em monumentos e imóveis classificados, tal qualificação não foi exigida. Foi considerado suficiente, de acordo com os programas de concurso das três empreitadas, que o concorrente possuísse o “alvará” (licença) de empreiteiro geral de reabilitação e conservação de edifícios. Por outro lado, e para reduzir ainda mais o grau de exigência, o critério de adjudicação adoptado foi o do preço mais baixo.

Em resultado, estão indigitados para adjudicatários destes três concursos empreiteiros generalistas que se dedicam à construção corrente de prédios e moradias, utilizando o betão armado, sem a qualificação que devia ter sido exigida face à natureza dos monumentos onde as intervenções vão ser realizadas.

Os métodos e critérios adoptados pelo IGESPAR nestes três concursos terão pesadas consequências, a concretizarem-se estas adjudicações:

• Colocarão sérias dúvidas quanto aos resultados das intervenções, pondo em risco monumentos nacionais que são, também, património mundial da UNESCO, o que é, desde logo, incompatível com a própria missão de salvaguarda do IGESPAR;

• Contrariarão os esforços de especialização que as empresas vocacionadas para a conservação do património vêm fazendo ao longo dos anos, no sentido de manterem vivos os saberes tradicionais e o conhecimento das antigas técnicas e materiais, conservarem artífices e operários especializados e formarem continuamente os seus recursos humanos de modo a dominarem os melhores métodos e técnicas de intervenção;

• Criarão um perigoso precedente, que tenderá a ser seguido por outras entidades adjudicantes de intervenções em monumentos e imóveis classificados, com prejuízos incalculáveis.

De notar que a não exigência de quaisquer requisitos de qualificação desrespeita as cartas e recomendações internacionais (algumas das quais ratificadas por Portugal), que determinam que as intervenções em bens culturais imóveis sejam executadas por profissionais e empresas com qualificações específicas. Contraria, designadamente, a Declaração de Roma (Assembleia do Comité Nacional Italiano do ICOMOS, 9-10 de Junho de 1983), a Convenção Quadro sobre o valor do Património Cultural para Sociedade (Conselho da Europa, Faro, 27 de Outubro de 2005), a Carta de Vila Vigoni (Bens Eclesiásticos, Março de 1994) e a Carta de Cracóvia, de 2000 – Princípios para a Conservação e Restauro do Património Construído.

Aliás, a inexistência de requisitos de qualificação desrespeita a própria obrigação do Estado, do Ministério da Cultura e do IGESPAR de zelar pela salvaguarda dos bens culturais imóveis, designadamente os números 2 e 3 do Artigo 3.º da Lei n.º 107/2001 de 8 de Setembro, o número 2, alínea c), do Artigo 60.º da mesma Lei, o número 2, alínea f), Artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 215/2006 de 27 de Outubro e o número 4, alínea o), do Artigo 3.º Decreto-Lei n.º 96/2007 de 29 de Março.

Conforme se refere acima, as habilitações requeridas não respeitam, sequer, o Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de Janeiro, que estabelece o regime dos “alvarás”, designadamente os números 1 e 2 do Artigo 31.º – Exigibilidade e verificação das habilitações, dado que a mera exigência do IGESPAR da classe de empreiteiro geral de reabilitação e conservação de edifícios não é adequada à realização da obra em causa, sendo a exigência da 10.ª subcategoria da 1.ª categoria, e da classe correspondente ao valor da empreitada a única habilitação adequada, uma vez que está em causa o restauro de bens imóveis histórico-artísticos. O argumento da alegada simplicidade das obras de restauro postas a concurso também não colhe, porque a Portaria n.º 19/2004, de 10 de Janeiro, ao consagrar uma 10.ª subcategoria para o Restauro de bens imóveis histórico-artísticos, não se refere ao tipo de obra a executar, mas sim à natureza do edifício (património arquitectónico) objecto da intervenção.

O procedimento escolhido – concurso público – com a agravante do critério de selecção ser o do preço mais baixo, não é o adequado para intervenções em bens culturais imóveis, que devem ser confiadas a empresas com qualificação específica. De entre os procedimentos previstos no Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, para a escolha das entidades a contratar, existem dois procedimentos que permitem a escolha pelas entidades adjudicantes daqueles que deverão ser os mais qualificados para apresentar proposta: o ajuste directo e o concurso limitado por prévia qualificação.

Finalmente, os critérios adoptados nestes três concursos, pelo IGESPAR, contrariam o compromisso assumido pelo GECoRPA e o então IPPAR de, nos termos do protocolo assinado em 7 de Dezembro de 2006, cooperarem com o objectivo de contribuírem para a excelência nas intervenções de conservação e restauro do património.

Face à gravidade destes factos, o GECoRPA dirigiu ao IGESPAR uma exposição em que solicita que os referidos concursos sejam repetidos em moldes que assegurem a salvaguarda dos bens culturais em causa, para o que é indispensável que as empresas executantes envolvidas possuam a necessária qualificação. Nessa exposição, o GECoRPA reiterou a sua disponibilidade para, nos termos do protocolo acima referido, colaborar na definição dos “requisitos complementares” de qualificação a exigir às empresas de construção que pretendam dedicar-se à conservação do património.

Lisboa, 21 de Dezembro de 2009

A Direcção do GECoRPA
21/07/2011

© Copyright Gecorpa. Todos os direitos reservados.
Develop By: Primeway - Creative Business Solutions