Revista Pedra&Cal

Barragens, um mal necessário?

Indíce

04 Editorial
 Vítor Cóias

06 As barragens ou os rios?
Os últimos 50 anos puseram a nu os impactos sociais e ambientais das barragens, sobretudo das de grandes dimensões. As barragens fragmentaram e transformaram os rios do mundo e afetaram milhões de pessoas
 Vítor Cóias

09 Barragens Prós e contras
As vantagens e as desvantagens das barragens constituem um tema que salta para a ordem do dia sempre que existem novos projetos de construção, como é o caso da edificação, até ao ano de 2020, das novas barragens previstas no PNBH
 João Bento Leal

12 Estudos e projetos para o estrangeiro da engenharia portuguesa de barragens
A engenharia portuguesa de barragens tem estado envolvida no projeto de grandes obras no estrangeiro, designadamente em Espanha, África e Américas Central e do Sul.
 Carlos Pina, António Lopes Batista

17 A observação e a gestão do risco no vale a jusante na verificação da segurança e da funcionalidade em aproveitamentos hidráulicos
Nas sociedades atuais, a gestão dos recursos hídricos é fundamental para um desenvolvimento económico e social sustentável, garantindo água para o abastecimento humano, a irrigação e a produção de energia elétrica.
 António Tavares de Castro, João Marcelino, Maria Teresa Viseu

20 Gestão da exploração e segurança das barragens
A EDP e as suas subsidiárias detêm a concessão da utilização dos recursos hídricos relativa a 78 aproveitamentos hidroelétricos com uma potência total instalada de cerca de 5 400 MW
 Ilídio Ferreira

23 O Plano de Investimentos em Hidroeletricidade da EDP num contexto de reforço da produção energética portuguesa com origem renovável
A hidroeletricidade tem uma importância estratégica em Portugal, fundamentalmente devido à contribuição que aporta ao crescimento da geração eólica, à possibilidade de armazenamento de energia em períodos de baixo consumo, à redução das emissões...
 Fernando Barbosa Teixeira, António Botelho

26 Impactes das barragens no litoral
Breve revisão teórica
 Joana de Sá

28 Alto Douro Vinhateiro Património Mundial
Índices socioeconómicos: balanço de uma década
 Esmeralda Paupério, Xavier Romão, Domingas Vasconcelos, Teresa Ferreira

32 Caminhos do desenvolvimento
Entre a barragem e a linha, onde fica o Tua?
 Regis Barbosa

36 Trasladação da Capela de São Lourenço
Construção do aproveitamento hidroelétrico do Baixo Sabor
 Filipe Ferreira, Belmiro Xavier

40 Desenvolvimento versus construção
O caso das novas barragens e as alternativas
 João Joanaz de Melo

44 Cidadania patrimonial, procura-se!
Os últimos dados recolhidos em 2000 pelos sociólogos da cultura que têm vindo a analisar as atitudes dos portugueses sobre o Património revelaram que 42% da população é visitante regular de monumentos e lugares históricos...
 Maria de Lourdes Henriques Raposo

47 Cartas & Convenções
Foi há 50 anos… A Carta de Veneza

48 Notícias

50 Vida Associativa

51 Agenda

52 Empresas associadas do GECoRPA - Grémio do Património

54 Livraria

Preço: 5,00 €

N.º 56
Barragens, um mal necessário?


EDITORIAL por Vítor Cóias | Diretor da Pedra & Cal

As barragens e os direitos das futuras gerações

"Crescei e multiplicai-vos, enchei e dominai a terra." Génesis, I:27

Construindo, por todo o planeta, as suas majestosas barragens, o Homem domina os rios mais caudalosos. Vêm-me à memória os documentários de atualidades da minha adolescência, quando, antes do filme da matinée, passavam no ecrã do cinema as imagens a preto e branco da propaganda do Estado Novo. Lembro-me das que noticiavam a inauguração da "obra do século", a barragem de Castelo do Bode, inaugurada por Salazar em 21 de janeiro de 1951.

Lembro-me do orgulho com que, mais tarde, já no Técnico, se falava dos triunfos da engenharia portuguesa e se percorriam em visita de estudo as grandes barragens do norte do País. E depois, no LNEC, quando eu próprio trabalhei em barragens, estudando o seu comportamento estrutural em modelos reduzidos, mostrando aos engenheiros estrangeiros que nos visitavam como é que, usando mercúrio, simulávamos a ação da pressão hidrostática sobre as curvas elegantes das barragens-abóbada. Métodos que os computadores, poucos anos mais tarde, tornariam obsoletos.

Mas, nessa altura, por outras paragens, muita coisa tinha já mudado na maneira como as pessoas e as comunidades vêm a construção de barragens. Logo no princípio do século passado a construção da barragem de O’Shaughnessy, no vale de Hetch Hetchy, Califórnia, encontrou forte resistência popular liderada pelo naturalista John Muir, o mesmo que promoveu a criação do parque natural de Yosemite.

Em Portugal, as ações contra a construção de barragens começaram muito tardiamente. O caso da construção do aproveitamento hidroelétrico de Foz Coa, travado pela descoberta de figuras de arte rupestre no vale e definitivamente abandonado em 1995, constitui o exemplo mais destacado.

Num impulso serôdio, ganhou forma e arrancou, há pouco tempo, no terreno, o Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroelétrico (PNBEPH). Este plano prevê atualmente a construção de sete novas barragens, algumas das quais em vales que chegaram até aos nossos dias na sua condição pristina secular. Uma, a de Foz Tua, está já em construção, e implica a perda, na prática irreversível, do valioso património natural e cultural do Vale do Tua.

Esta não é a primeira vez que as barragens estão no foco do tema de capa da P&C. O número 21, publicado há dez anos e dedicado ao tema "Energia e património", trazia na capa uma fotografia da "portentosa" nave dos alternadores da barragem de Miranda do Douro e um artigo sobre o trabalho, não de engenheiros, mas de arquitetos, nas barragens do Douro Internacional.

O tema de capa do presente número da P&C concentra-se nas barragens, com as suas múltiplas funções e implicações. Os conteúdos dos artigos que dão corpo a esta nova abordagem do tema mostram bem como ele é complexo e controverso.

Como engenheiro, é meu dever respeitar os princípios do desenvolvimento sustentável. Aquele que, segundo Chrisna du Plessis, permite manter um equilíbrio dinâmico duradouro entre as exigências das pessoas em equidade, prosperidade e qualidade de vida e o que é ecologicamente possível. Não tenho dúvidas que a construção de mais barragens em Portugal é dispensável e que há alternativas mais respeitadoras da sustentabilidade.

Com exceção das barragens romanas ou como tal percebidas, este tipo de obra não tem, entre nós, merecido grande atenção enquanto património cultural construído. O Sistema de Informação para o Património Arquitetónico (SIPA) contém registos de 24 barragens "monumento", a maior parte das quais referenciadas como romanas. Que a barragem de Foz Tua pudesse ser travada, e que os blocos de betão já construídos pudessem ficar para a história como um monumento à visão da atual geração e como prova de que, afinal, tinha algum respeito pelos direitos dos que vêm a seguir!
 


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